quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Esperança




Hoje é dia 31/12/09. Mais um ano chega ao fim e outro se aproxima. Não apenas mais um ano, mais uma década. Em todo o mundo pessoas estão festejando à medida em que o relógio alcança a meia-noite. Neste momento o coração de milhões de homens se enche de esperança. Uma mudança de data, uma convenção social, pura ficção. Mas não é assim, inventado, tudo o que dá esperança aos homens?

Como se fosse mágica, o simples movimento do relógio, torna a noite em dia tamanha a profusão de fogos de artifício a riscar e iluminar o céu. Som, festa, alegria. As pessoas comemoram, e dançam, e beijam, e fazem votos de um ano melhor. E acreditam, verdadeiramente acreditam, que o ano será melhor.

Mas tal como a mágica do melhor ilusionista, tudo não passa de um show. Uma cortina de fumaça para esconder, camuflar a verdade. Distrai-se a atenção do respeitável público com luzes e sons, enquanto um jogo de espelhos colocado no local certo, no momento certo, cria a ilusão desejada.

Quando a noite passa e o primeiro dia do calendário tem início, resta apenas a ressaca do champagne e de todos os demais excessos cometidos no fim do ano. No dia 02 de janeiro, quando todos devem retornar ao trabalho e a suas rotinas, a lembrança daquela esperança de próspero ano começa a se desbotar.

Ao longo das semanas as resoluções e promessas feitas naquele momento de comunhão vão sendo abandonadas e esquecidas. Quando se percebe chegou dezembro novamente e o ano que se encerra em pouco se difere do anterior. Mas o coração dos homens mais uma vez se enche de esperança. A idéia de um novo começo move a humanidade, como se à meia-noite fosse possível apertar um botão “reset” de nossas vidas.

Cristiane Neves
31/12/09
12:18 PM

sábado, 26 de dezembro de 2009

Fotos



Porque, enfim, tudo passa;
não sabe o tempo ter firmeza em nada;
e nossa vida escassa
foge tão apressada
que, quando se começa, é acabada. (Camões)



Estava vendo fotos do passado. Não de um passado muito distante, mas de uma página que virei há pouco tempo. Fotos de dois, três anos atrás. Quem diria que tanto mudaria em tão pouco tempo. Eu definitivamente não sou a mesma pessoa que aparece naquelas imagens. Não foi apenas meu cabelo que mudou, mas eu. É como se na naquela época eu conhecesse a teoria das coisas, mas só agora conseguisse colocá-la em prática.

Mas não é de mim que quero falar, e sim daquelas pessoas que me cercavam nas fotos. Amigos, colegas, gente com quem não encontro mais. Com uma ou duas pessoas ainda mantenho um contato maior, mesmo uma delas tendo colocado o oceano atlântico inteiro entre nós. Isso é amizade.

Pergunto-me como todas essas pessoas de minha vida passada estão. Terão mudado tanto quanto eu sinto que mudei? Continuarão as mesmas? Será que se nos reencontrássemos teríamos o mesmo riso leve de outrora? O mesmo ar despreocupado, a mesma facilidade de nos entendermos?

A minha nova vida não é ruim. Tenho excelentes amigos e colegas que trazem toda a jovialidade e companheirismo que eu poderia querer. E a maioria deles eventualmente também passará e será, no fim das contas, apenas fotos digitalizadas guardadas na memória de um computador e em minha memória falha. E eu, nostálgica como sou, terei a mesma reação de agora ao visitar essas lembranças. A dor da saudade de um quadro tão perfeito que só a passagem do tempo permite pintar.

Fico me imaginando velhinha, sentada em uma cadeira de balanço com um gato gordo no colo, remexendo em fotos antigas (em uma espécie de palmtop futurista, claro). O que sentirei ao ver me tão jovem, ao lembrar de um mundo que será, provavelmente, muito diferente daquele em que estarei vivendo? Saberei reconhecer meus amigos, chamá-los pelos nomes? Conseguirei me lembrar das situações vividas, da importância que um dia tivemos na vida uns dos outros? Terá alguma dessas amizades sobrevivido ao tempo?

Não, não quero tentar advinhar meu futuro. É melhor que o tempo ande sem que se perceba, ainda que estejamos fadados a, de vez em quando, encarar sua passagem. Mesmo porque, nas palavras de Manuel Bandeira: “Só o passado verdadeiramente nos pertence. O presente... O presente não existe: Le moment où je parle est deja loin de moi. O futuro diz o povo que a Deus pertence. A Deus... Ora, adeus!”


Cristiane Neves
29/10/2006
23:03
Domingo

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Ano novo





Ela estava estirada sobre a espreguiçadeira na beira da praia. A lua iluminava o céu, mas nenhuma estrela lhe fazia companhia. A mulher segurava uma taça de champagne contra a luz que emanava da lua e dos postes que clareavam a orla. Pequenas esferas de gás se acumulavam no dourado da bebida. Sua disposição na taça, expostas contra a luz as fazia parecer uma constelação, capturada para toda a eternidade, dentro de um copo. As estrelas aprisionadas seriam engolidas pela deusa que, deitada, sentia a areia alva em seu pés e esperava pelo ano novo.

A multidão aumentava com o passar das horas, mas ela não os via. Olhos fixos nas borbulhas do champagne que a faziam lembrar de tantas coisas sem importância. Uma música italiana, uma crônica e décadas passadas apenas imaginadas.

De vez em quando levava a taça aos lábios e bebericava o líquido que continha. Os colegas com quem viera à praia por vezes a chamavam a participar da festa, mas ela os afastava com um gesto e palavras vagas, preferindo apenas a companhia da taça e dos astros que continha.

O vestido leve mal a cobria, sendo erguido pelo vento litorâneo. O biquini por baixo, exposto pela alça caída, era a unica coisa que a fazia parecer pertencer àquele quadro. Ou pelo menos foi esta a sensação que o homem que a observava teve. De pé junto à mesa de um quiosque, bebendo cerveja e rindo com os amigos ele não pôde deixar de vê-la. Ela parecia uma ilha solitária cercada por um mar de pessoas às quais se mantinha indiferente.

O tempo passou. Homens e mulheres vestidos de branco se adiantavam ao mar com ofertas a Iemanjá. O futuro estava cada vez mais próximo e enchia o coração das pessoas de esperança. Abastecido com essa sensação de possibilidades vindouras o homem resolveu se aproximar da mulher.

Ele era um ser comum, destes que existem aos milhares pelo mundo. Seja culpa da globalização, do presidente, de alienígenas ou de nossos pais, o fato é que a cada dia que passa as pessoas estão cada vez mais iguais. Mesmos gostos, mesmo passado, mesmas experiências, mesmos programas televisivos a formar suas personalidades. E este homem era feito do mesmo molde que a maior parte da sociedade, e isto foi a primeira coisa que ela pensou ao vê-lo se levantar de sua cadeira, tomando coragem para abordá-la.

A verdade é que ela era tudo menos ordinária. A maldição e a benção. Ambos os lados de uma mesma moeda com a qual ela havia sido presenteada quando de seu nascimento. Um fardo a carregar e ainda uma luz a iluminar a escuridão. É o mito da caverna de Platão e o eterno paradoxo sobre o que é melhor, ter o conhecimento ou viver na ignorância. Talvez o mais certo é que lhe fosse um fardo, pois lhe permitia ver que fracasso se tornara. Era inteligente o suficiene para reconhecer como deveria ser para alcançar o gênio desejado, mas não possuia o suficiente para ser gênio ela mesma.

A reflexão continuava, enquando ela observava aquele homem forte e bronzeado se aproximar. O macho dominante de seu grupo, um exemplo de como, ainda que racionais, os seres humanos não passam de animais. O instinto de se mostrar superior aos que lhe rodeiam, e, simultaneamente, aceitar a superioridade daqueles que se encaixam melhor no perfil determinado pela sociedade, seguindo-os e lhes imitando o exemplo, os buscando para resolução de problemas, conselhos, e vendo neles modelos a serem copiados. O macho-alfa.

O pensamento final da mulher, quando o homem se ajoelhou ao lado de sua cadeira, na areia fina e fria da praia, era de que ele não passava de um estereótipo. Ela se perguntou se, parada ali como estava, com seu visual pouco ortodoxo, não estaria por acaso se encaixando, ela própria, em um estereótipo que pareceria explicá-la àquele homem antes mesmo de trocarem uma palavra. Estaria o estereo (infrutífero) – tipo (caracter) certo quanto a ela? Estaria ela certa quanto a ele?

_ Tá boa sua bebida? – foi a primeira frase que ele formulou. Não era a frase irônica e bem humorada que ela esperava ouvir de seu príncipe encantado.

_ É a bebida oficial das comemorações. Ano novo, noivados, casamentos, nascimentos, todas as datas ditas importantes devem ser brindadas com champagne, provavelmente mais pelo seu valor econômico do que por seu gosto. Independente do motivo que faz essa bebida tão importante não posso deixar de me perguntar por que a passagem de um dia para o outro, que nada mais é que uma simples convenção social, mereça tanto destaque quanto os demais eventos que eu citei.

O homem coçou a cabeça. Não tinha entendido metade das coisas que ela tinha acabado de falar. Olhou para o mar, pensando que talvez um mergulho na água fria clarearia sua mente embriagada.

A mulher sorriu, vendo a confusão no rosto do jovem bronzeado. Então ela se espreguiçou e sacudiu a cabeça, como que tentando se despertar para a vida real. Virou o resto de bebida em sua taça e sentou ereta na cadeira.

_ Então, você vem muito por aqui? – ela perguntou, sem consequência.

Ele sorriu, desistindo do banho frio e se prendendo nos olhos da garota, iluminados pelos fogos de artifício.

Pelo menos ela começaria o ano fingindo ser “normal”.



Cristiane Neves

12/01/09

Oi




Olá, como está, tudo bem?
Já nos conhecemos? Me desculpe, tenho problemas em guardar rostos... Mas pode entrar, seja bem vindo de qualquer jeito. Não esqueça de limpar os pés.

Bom, isto aqui é o que está vendo, um blog. Não prometo que dure, mas vamos ver no que vai dar. Em primeiro lugar, devo dizer que darei prioridade a textos antigos. Em segundo, vou tentar deixar identificado quando possível a data em que o texto foi produzido.

Fiquei dividida ao pensar em como começá-lo. Imagino ao menos três textos que poderiam dar início a este espaço virtual, mas por fim escolhi um para se encaixar ao momento em que estamos passando, de fim de ano. É aquele que está ali, logo em cima.

Tchau e até a próxima