terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O Homem Perfeito




        As pessoas têm uma idéia pré-concebida do que precisam encontrar na vida para serem felizes. Baseando em milênios de cultura popular, livros, teatro, contos de fada, televisão, cinema, música, é como se houvesse um roteiro que a vida teria de seguir para chegarmos ao “...e viveram felizes para sempre!”.
        Nascer, ter uma infância feliz cheia de amigos e brincadeiras de boneca, bola e bicicleta. Crescer, se apaixonar e ter o coração partido  no colegial. Ir para a faculdade, se formar, encontrar um emprego e o grande amor de sua vida. Casar-se e ter um casal de filhos. Conseguir a casa própria, carro, vigens de férias em família para o litoral. Formar os filhos, se aprosentar e envelhecer junto à pessoa amada. Morrer dormindo em uma tarde de primavera.
        Mas a vida não é previsível assim. Ela é cheia de imprevistos e impecilhos, dificuldades, tragédias, surpresas. No entanto, é interessante pensar na expectativa das pessoas, e foi refletindo sobre essas expectativas, que me peguei imaginando as minhas próprias, principalmente no que diz respeito ao Homem Perfeito, meu Príncipe Encantado.
Como sonhar não paga imposto (por enquanto) comecei pensando em sua aparência física. Ainda não me decidi se iria preferir um Rodrigo Santoro ou um Johnny Depp. Acredito que escolho Depp, pelos maxilares proeminentes que tanto me atraem. Pensei em dar-lhe um par de olhos verdes, mas cheguei à conclusão de que ficaria uma beleza muito enjoativa, com um doce que é doce demais, como uma lata inteira de leite condensado comida de uma vez só.
Criada uma feição para meu Príncipe, comecei a pensar em seus modos. Um charme discreto e natural, que ele próprio ignore possuir. Um jeito de olhar que pareça perfurar meus olhos e entrar dentro de mim, desvendando todos os meus segredos: assustadoramente desconcertante, mas ainda assim, impossível de desviar o olhar.
Ele teria uma simpatia cativante e um sorriso de moleque safado, para me lembrar constantemente o quanto me deseja. Seria capaz de um abraço que me deixaria sem fôlego e com as pernas bambas, e um beijo que me faria esquecer de todo o mundo à minha volta.
Quando triste, meu Homem Perfeito deveria ficar com carinha de cachorro perdido, precisando de colo. Tem de saber me consolar também. É preciso que saiba que política, economia, trabalho são importantes, mas não o que há de mais importante na vida. Deve gostar de argumentar e saber aceitar quando perdeu o argumento. É necessário que tenha paciência comigo por não aceitar perder um argumento.
Ele teria pequenos defeitos, é claro, para não ser cansativo. Apertaria a pasta de dentes pelo meio, deixaria toalhas molhadas sobre a cama e cismaria em tirar meu livros de ordem. Quando nós brigassemos, ele seria irônico e sarcástico. Quero também que ele tenha algo muito brega em seu passado, como ser fã de Spice Girls, por exemplo.
Meu príncipe saberia ser rude e viril em certos momentos, e absolutamente carinhoso e gentil em outros. Em alguns, um jeito firme, seguro e forte de abraçar, em outros, aquela pegada mais suave, um toque que mal roça a pele.
Ele ainda seria inteligente sem ser esnobe, para me ensinar com humildade e ter ainda o que aprender comigo. Gostaria de ler. Saberia quem é David Copperfield (não falo do mágico); que filme Preto & Branco não é velharia; e que arte é uma das coisas mais importantes do mundo, pois promete ser eterna. Saberia ainda que filosofar é bom, mas que “há metafisica bastante em não pensar em nada”. Saberia que acabei de citar Alberto Caiero e que Caiero é Fernando Pessoa.
Gostaria que meu Homem Perfeito soubesse ser romântico, sem ser pegajoso; que fosse espontâneo para propor pequenas loucuras; que topasse as minhas pequenas loucuras; que aproveitasse a vida. Que sentisse prazer ao deitar em uma pedra quente às margens de um rio ao entardecer, e, que quando a noite chegasse, ele olhasse as estrelas e visse para além de meros pontinhos brilhantes no céu. Que ele tivesse a capacidade de fechar os olhos e não pensar em nada, apenas sentir.
E, principalmente, que me cativasse e me amasse... Mas como sei que este príncipe encantado não existe, ficarei muito feliz se um dia tropeçar em algum sapo que reúna, ainda que apenas, estes dois últimos requisitos que enumerei.

Cristiane Neves
2006

3 comentários:

  1. Crissss... amei o post...

    Muitas vezes a gente acha que 'perfeito' são estes nossos sonhos, idealizações... Só que o tempo e a vida nos surpreendem...

    Ora o príncipe não é belo como vislumbrávamos mas SABE NOS CATIVAR E NOS AMAR! Ora, a beleza deste supera nossas expectativas, mas as demais características são falhas...

    E então... quando menos esperamos ou quando olhamos com um olhar mais observador, mais profundo para os lados, damo-nos a chance de conhecer novos príncipes - diferentes das utopias - e aprendemos também que esta vida tão certinha, tão perfeitinha... NÃO TERIA A MENOR GRAÇA!

    Fala sério! Nada melhor do que discutir, gritar, chorar... e depois, fazer as pazes...

    O amor PRECISA de barreiras e de superar estes obstáculos para se fortalecer!

    Grande beijo, Cris. Saudades! ='(

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  2. A felicidade até pode existir, mas certamente não é no outro.

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  3. Cris... amiga...espero que saiba quem ta falando...'ainda nao virei carioca' kk
    adorei seus textos..
    estão lindos...
    este então...esta perfeito...
    adorei cada palavra...
    parabens...!!!

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